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Responsabilidade do Município por Danos em Veículos Causados por Omissões na Conservação de Vias Públicas

  • Foto do escritor: Dra. Ludmilla Ferreira dos Anjos
    Dra. Ludmilla Ferreira dos Anjos
  • 29 de jul.
  • 4 min de leitura

1. Introdução: O dever do poder público de preservar o espaço urbano


O Município, enquanto ente federativo responsável pela administração das cidades, possui o dever constitucional de garantir a segurança e a integridade dos bens e das pessoas que circulam em seu território. Tal dever decorre do artigo 37, §6º, da Constituição Federal, que trata da responsabilidade objetiva do Estado pelos danos que seus agentes, nessa qualidade, causarem a terceiros. Não se exige a comprovação de dolo ou culpa, bastando a demonstração do dano, do nexo de causalidade e da omissão estatal.


Infelizmente, a precariedade da infraestrutura urbana é uma realidade em diversas cidades brasileiras. Motoristas e pedestres se deparam diariamente com buracos, sinalização danificada, quedas de árvores podres e esgotos a céu aberto. Quando essas falhas causam prejuízos materiais — como danos em veículos — ou mesmo abalos morais, surge o dever de indenizar por parte do Município.


O presente artigo tem como objetivo esclarecer os direitos dos cidadãos que sofreram danos em seus veículos em razão da omissão do Município em manter e fiscalizar adequadamente suas vias públicas, destacando fundamentos jurídicos, doutrinários e jurisprudenciais.


2. Buracos nas vias públicas e prejuízos aos veículos: a responsabilidade do ente municipal


Buracos em vias públicas são uma das principais causas de acidentes e avarias em veículos. Quebra de suspensão, estouramento de pneus e danos na lataria são ocorrências comuns quando a pavimentação urbana está degradada. Nesses casos, está configurada a responsabilidade objetiva do Município, conforme a Súmula 187 do STJ: “É responsabilidade do Município o ressarcimento de prejuízos decorrentes de acidente ocorrido em via pública em razão da falta de conservação”.


A omissão do ente público em conservar a via pública caracteriza o dever de indenizar, especialmente quando demonstrado que o dano não foi causado por culpa exclusiva do condutor. Além disso, a responsabilidade não está restrita a ruas e avenidas centrais — estende-se a qualquer via sob responsabilidade da municipalidade.


O motorista que tiver seu veículo danificado por buracos deve reunir provas como fotos do local, do veículo danificado, boletim de ocorrência, orçamento do conserto e, se possível, testemunhas ou reportagens que comprovem que o problema já era conhecido e não foi solucionado. Esses elementos são fundamentais para demonstrar o nexo causal e afastar a tese de culpa exclusiva da vítima.


3. Queda de árvores e postes sobre veículos: dano previsível e evitável


Outro tipo de omissão recorrente envolve quedas de árvores mal cuidadas ou postes em estado precário que desabam sobre veículos. Muitos municípios não realizam podas preventivas nem vistorias periódicas para identificar árvores doentes ou com risco iminente de queda, o que contribui para acidentes graves, inclusive com risco à vida.


Nesses casos, também se aplica a responsabilidade objetiva. A jurisprudência do STJ é pacífica ao reconhecer que a queda de árvores em veículos estacionados ou em circulação configura omissão estatal, ensejando indenização por danos materiais e, em casos mais graves, danos morais.


Para fundamentar a ação, é recomendável solicitar perícia técnica ou laudo ambiental, caso o município alegue “força maior” ou evento da natureza. A jurisprudência exige que o ente público prove que o evento foi imprevisível e inevitável — o que, na maioria das vezes, não se verifica.


4. Outras omissões que geram o dever de indenizar: sinalização, alagamentos e desníveis


Além dos buracos e da queda de árvores, outras situações decorrentes da omissão do poder público podem gerar danos aos veículos e ensejar responsabilidade civil do Município. Dentre elas, destacam-se:


  • Sinalização defeituosa ou inexistente: Ausência de placas, semáforos apagados ou mal posicionados e faixas de pedestres apagadas podem causar acidentes que comprometem a segurança do trânsito.

  • Desníveis bruscos, tampas de bueiros mal fixadas ou abertas: Podem causar perda de controle do veículo, resultando em danos materiais e físicos.

  • Alagamentos por falta de drenagem urbana: Quando as galerias pluviais estão entupidas ou mal planejadas, fortes chuvas causam enchentes que afetam veículos e imóveis, sendo responsabilidade do ente público adotar medidas de prevenção.


Cada uma dessas situações pode justificar ações de indenização contra o Município, desde que o cidadão comprove que houve omissão e que os danos decorreram diretamente dessa falha administrativa. A jurisprudência brasileira tem consolidado esse entendimento, afastando a tese de caso fortuito quando há negligência do poder público.


5. Danos morais: quando são devidos e como comprová-los


Em muitos casos, além dos danos materiais evidentes (conserto do veículo, perda de bens, etc.), o evento causa abalos psicológicos, frustrações, constrangimentos e medo. Esses impactos, quando extrapolam o mero dissabor do cotidiano, ensejam o pagamento de indenização por danos morais.


A fixação do dano moral deve observar os princípios da razoabilidade e proporcionalidade, servindo tanto como reparação quanto como forma de desestimular a repetição da conduta omissiva. Juízes têm reconhecido a ocorrência de dano moral em casos de exposição a risco, prejuízo emocional e sensação de desamparo diante da inércia do poder público.


A recomendação ao cidadão é: registre tudo. Fotos, vídeos, testemunhos, laudos e comprovantes de atendimento médico ou psicológico reforçam o pedido de reparação moral, sobretudo se houver risco à integridade física ou forte impacto emocional.


Conclusão: A omissão do Estado não pode ser normalizada


A responsabilidade civil do Estado por omissão na manutenção da infraestrutura urbana está solidamente amparada na Constituição Federal e na jurisprudência dos tribunais superiores. Buracos, árvores mal cuidadas, falhas de sinalização e alagamentos não devem ser aceitos como "parte do cotidiano", mas sim enfrentados juridicamente como falhas administrativas que impõem ao ente público o dever de indenizar.


Cidadãos que sofrem prejuízos têm o direito de buscar reparação pelos danos suportados, e o papel do advogado é fundamental para garantir o acesso à justiça. Promover a responsabilização do poder público é também um ato de cidadania e de defesa coletiva, pois pressiona a administração a cuidar melhor da cidade e prevenir novos acidentes.

 
 
 

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